A sociedade atual caracteriza-se por ‘funcionar’ através de relações em que olhar o Outro com maior cuidado é um fator secundário. O ser humano, por suas características relacionais inatas precisa do Outro para viver e, de uma certa forma, esqueceu-se disso.
A liquidez nas relações acontece cada vez mais. As conseqüências são claras, os afetos se diluem em fragilidades e medos e transformam-se em agressividade, como defesa dos ‘ataques’ na relação espaço-tempo.
É possível afirmar e confirmar, já que somos todos usuários direta ou indiretamente da ‘situação’ Trânsito atual, que toda a agressividade, todo o descontentamento, todos os mecanismos de defesa dos indivíduos refletem-se no ir e vir diários do trânsito (local este no qual todos se des-encontram ao invés de encontrarem-se).
Pois, que coisa...
Conflitos, agressões físicas, mortes, perdas, lutos, choros, amores, os donos do mundo, seres intocáveis e superiores... Tudo vemos e tudo acontece. Pessoas ditas mais tranqüilas ou cautelosas, preventivas existem, mas não aparecem muito. Por quê? Primeiro porque são em menor número e segundo por motivos de autodefesa também.
Estudar comportamentos humanos nesse espaço que deveria ser de encontros significa uma tentativa de buscar formas alternativas para amenizar os resultados gritantes de perdas de vidas, provocadas ou acidentais, e penso que em aula começamos a refletir na importância do humano ser, estar e manter-se humano, apesar das contrariedades e das exigências mentais, físicas e afetivas provocadas quando em trânsito no trânsito.
Muito interessante a pesquisa realizada sobre os significados diferenciados para cada usuário. O indivíduo, motorista, deposita no objeto carro a situação de casa, investindo nele, objeto carro, significados como: quarto, sala, cozinha, banheiro. Ou seja, funções que seriam participativas do lar, são atribuídas ao carro. Fato importante que reflete o tipo de vida que temos na sociedade brasileira e nos leva a questionar, inclusive a instituição família, lar, além, claro, dos níveis dependentes que vivemos quanto à estética, quanto à saúde e quanto à educação.
Se há conflito em casa, não haveria no trânsito?
Casa: espaço de proteção; espaço de encontro; espaço de privacidade e espaço de conflito, pois não?
Todos esses significados são fundamentais para a compreensão do comportamento dos indivíduos no cotidiano do trânsito. As atuações são semelhantes, porém, penso que ilusórias. Mesmo que assim ocorra, a ilusão está presente na situação de convivência.
Pergunto: Onde termina a ilusão e começa a realidade?
Respondo: Provavelmente nas perdas que acontecem sem o tal controle que supostamente em casa é possível.
Para terminar, é pertinente apontar uma grande diferença: no trânsito, além da responsabilidade que deveríamos ter sobre a vida humana, apenas tendo um comportamento preventivo de situações fatais, algo terrível que aparece a olhos vistos é o contraponto disso: a total indiferença para com o significado de uma vida humana. Ou seja, o humano, do ser humano, se desfaz diante da sedução dos atrativos da sociedade contemporânea, ou pós alguma coisa...
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